Desistência de Barbosa poderia favorecer Marina e Bolsonaro,
dizem cientistas políticos.
Mesmo sem anunciar candidatura, Joaquim Barbosa chegou a 10% das
intenções de voto em pesquisas.
O anúncio do ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF)
Joaquim Barbosa (PSB) de que não será candidato à Presidência da República em
outubro tende a favorecer as candidaturas de Marina Silva (Rede) e Jair
Bolsonaro (PSL), segundo cientistas políticos entrevistados pela BBC Brasil.
Para eles, Bolsonaro e Marina - líderes nas pesquisas eleitorais
em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não é considerado - atraem
eleitores que poderiam ser seduzidos por Barbosa e buscam um candidato de fora
do mundo político tradicional ou identificado com o discurso anticorrupção.
O ex-ministro afirmou em sua conta no Twitter que a decisão de
não concorrer era estritamente pessoal e ocorria após várias semanas de
reflexão.
Barbosa alimentou especulações de que poderia se lançar à
Presidência ao ingressar no PSB em abril, a um dia do prazo final para
filiações de candidatos a cargos nas eleições de 2018.
No dia 15 daquele mês, ele obteve entre 8% e 10% das intenções
de voto numa pesquisa do Datafolha. Nos cenários em que a candidatura do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) era desconsiderada, Barbosa ficou
em terceiro lugar, em empate técnico com Ciro Gomes (PDT) e Geraldo Alckmin
(PSDB) e atrás de Jair Bolsonaro (PSL) e Marina Silva (Rede).
Marina Silva pode atrair eleitores que viam Barbosa como capaz
de romper polarização, diz analista
O bom desempenho do ex-ministro mesmo antes de confirmar uma
candidatura levou muitos analistas a avaliar que Barbosa tinha grande
potencial, podendo atrair eleitores de diferentes campos políticos.
Outsider e herói anticorrupção
Para a cientista política Esther Solano, professora da
Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), o ex-ministro simbolizava duas
questões que terão peso na disputa deste ano: a luta anticorrupção e a rejeição
a políticos tradicionais.
Solano diz que, ao conduzir no STF o processo do mensalão, que
levou à prisão altos dirigentes do governo Lula, em 2012, Barbosa se tornou um
ícone do combate à corrupção.
"Ele representou o que o (juiz federal Sérgio) Moro
representa hoje: a ideia de um herói messiânico, expoente da moral, da ética e
dos princípios."
Para Solano, Barbosa também pontuava bem nas consultas
eleitorais por ser um outsider - uma figura alheia ao mundo político. "Os
políticos profissionais hoje estão muito desvalorizados, porque são vistos como
atrelados à corrupção."
Com o anúncio de que o ex-ministro não se candidatará, a
professora diz acreditar que Bolsonaro tende a se beneficiar.
"Ele também se coloca como um outsider, embora ele não
seja, e como o único candidato não envolvido com corrupção."
Solano diz que Marina também pode, em menor grau, absorver
potenciais eleitores de Barbosa, por ser vista por muitos como alheia aos
partidos tradicionais e não envolvida com corrupção.
Segundo Solano, Marina também pode agradar eleitores que pendiam
para Barbosa por vê-lo como alguém capaz de superar a polarização entre
esquerda e direita.
Desde que deixou o PT, em 2009, a ex-ministra do Meio Ambiente
vem se movendo para o centro do campo político, segundo analistas. No segundo turno
da eleição de 2014, ela apoiou o candidato do PSDB, Aécio Neves.
Consolidação de candidaturas
Capitão Jair bolsonaro idera pesquisas em que candidatura de
Lula é desconsiderada.
Para Geraldo Tadeu Monteiro, coordenador do Centro Brasileiro de
Estudos e Pesquisas sobre a Democracia (Cebrad), da Universidade do Estado do
Rio de Janeiro (Uerj), Barbosa desiste de concorrer num momento de intensa
negociação entre os partidos.
Nos últimos dias, o MDB sinalizou que poderá apoiar a candidatura
de Geraldo Alckmin, do PSDB; o ex-governador baiano Jaques Wagner, do PT, disse
que seu partido poderia apoiar Ciro Gomes, do PDT, ao mesmo tempo em que outros
dirigentes do PT reiteram a candidatura Lula; e o senador e pré-candidato
Álvaro Dias (Podemos) defendeu uma aliança com o empresário Flávio Rocha (PRB),
também pré-candidato.
Para Monteiro, a saída de Barbosa "joga o PSB nessas
conversas". Ele diz que há dois caminhos principais para o partido:
reeditar a aliança com Marina Silva, que vigorou na eleição de 2014, ou
integrar uma possível coalizão de esquerda em torno de Ciro Gomes - opção que
ele considera mais provável.
Em entrevista à "Folha de São Paulo" nesta
terça-feira, o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), deu mais um
empurrão à candidatura de Ciro ao defender que os partidos de esquerda apoiem o
político cearense.
Segundo Monteiro, à parte os impactos do anúncio de Barbosa nas
negociações partidárias, o gesto deve favorecer Marina Silva.
Para o professor, a ex-ministra "trafega na mesma faixa que
Barbosa", vista como uma política ao centro do espectro político e de
origem humilde.
Embaralhamento
Para Flávia Biroli, professora de Ciência Política da
Universidade de Brasília (UnB), é difícil avaliar os impactos da desistência de
Barbosa para os demais postulantes ao Planalto, pois a candidatura do
ex-ministro jamais se consolidou e pouco se sabe sobre seus potenciais
eleitores.
Ela diz que o anúncio de Barbosa afeta uma articulação que
estava em curso no movimento negro. "Havia a possibilidade de que a
presença de um homem negro na disputa pudesse atrair esse segmento,
tradicionalmente posicionado na centro-esquerda."
Para Biroli, a presença de Barbosa embaralhava a disputa, já que
ele jamais detalhou suas posturas políticas.
"É possível que, não existindo sua candidatura, tenhamos um
cenário um pouco mais claro em termos de centro-direita e
centro-esquerda."
João Fellet
- @joaofelletDa BBC Brasil em São Paulo.
BBC BRASIL.
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